Jesus transplantou da Palestina para a região do Cruzeiro a árvore magnânima do seu Evangelho, a fim de que os seus rebentos delicados florescessem de novo, frutificando em obras de amor para todas as criaturas. Ao cepticismo da época soará estranhamente uma afirmativa desta natureza. O Evangelho? Não seria mera ficção de pensadores do Cristianismo o repositório de suas lições? Não foi apenas um cântico de esperança do povo hebreu, que a Igreja Católica adaptou para garantir a coroa na cabeça dos príncipes terrestres? Não será uma palavra vazia, sem significação objetiva na atualidade do globo, quando todos os valores espirituais parecem descer ao "sepulcro caiado" da transição e da decadência? Mas, a realidade é que, não obstante todas as surpresas das ideologias modernas, a lição do Cristo aí está no planeta, aguardando a compreensão geral do seu sentido profundo. Sobre ela, levantaram-se filosofias complicadas e as mais extravagantes teorias salvacionistas. Em seu favor, muitos milhares de livros foram editados e algumas guerras ensangüentaram o roteiro dos povos. Entretanto, a sublime exemplificação do Divino Mestre, na sua expressão pura e simples, só pede a humildade e o amor da criatura, para ser devidamente compreendida. Do seu entendimento decorre aquele "Reino de Deus" em cada coração, de que falava o Senhor nas suas meigas pregações do Tiberíades - reino de amor fraternal, cuja luz é o único elemento capaz de salvar o mundo, que se encaminha para os desfiladeiros da destruição.
E os verdadeiros aprendizes, os crentes sinceros no poder e na misericórdia do Senhor, esperam, com os seus labores obscuros, o advento da cristianização da humanidade, quando os homens, livres de todos os símbolos sectários de separatividade, podem entender, integralmente, as maravilhas ocultas da obra cristã. Nas suas dolorosas provações dos tempos modernos, quando quase todos os valores morais sofrem o insulto da mais ampla subversão, esses espíritos heróicos e humildes sabem, na sua esperança e na sua crença, que, se Deus permite a prática de tantos absurdos, por parte dos poderosos da Terra, que se embriagam com o vinho da autoridade e da ambição, é que todas essas lutas nada mais representam do que experiências penosas, por abreviar a compreensão geral das leis divinas no porvir. E, serenos na sua resignação e na sua sinceridade, conhecem, ainda, que as lições do Evangelho não são símbolos mortos e aguardam, cheios de confiança no mundo espiritual, a alvorada luminosa do renascimento humano.
Nessa abençoada tarefa de espiritualização, o Brasil caminha na vanguarda. O material a empregar nesse serviço não vem das fontes de produção originariamente terrena e sim do plano invisível, onde se elaboram todos os ascendentes construtores da Pátria do Evangelho.
Estas páginas modestas constituem, pois, uma contribuição humilde à elucidação da história da civilização brasileira em sua marcha através dos tempos. Têm por único objetivo provar a excelência da missão evangélica do Brasil no concerto dos povos e que, acima de tudo, todas as suas realizações e todos os seus feitos, forros de miseráveis troféus das glórias sanguinolentas, tiveram suas origens profundas no plano espiritual, de onde Jesus, pelas mãos carinhosas de Ismael, acompanha desveladamente a evolução da pátria extraordinária, em cujos céus fulguram as estrelas da cruz. São elas, ainda, um grito de fé e de esperança aos que estacionam no meio do caminho. Ditadas pela voz de quem já atravessou as estradas poeirentas e tristes da Morte, dirigem-se aos meus companheiros e irmãos da mesma comunidade e da mesma família, exclamando:
- Brasileiros, ensarilhemos, para sempre, as armas homicidas das revoluções! ... Consideremos o valor espiritual do nosso grande destino! Engrandeçamos a pátria no cumprimento do dever pela ordem, e traduzamos a nossa dedicação mediante o trabalho honesto pela sua grandeza! Consideremos, acima de tudo, que todas as suas realizações hão de merecer a luminosa sanção de Jesus, antes de se fixarem nos bastidores do poder transitório e precário dos homens! Nos dias de provação, como nas horas de venturas, estejamos irmanados numa doce aliança de fraternidade e paz indestrutível, dentro da qual deveremos esperar as claridades do futuro. Não nos compete estacionar, em nenhuma circunstância, e sim marchar, sempre, com a educação e coma fé realizadora, ao encontro do Brasil, na sua admirável espiritualidade e na sua grandeza imperecível!
Humberto Campos. (*)
* Espírito.1
O CORAÇÃO DO MUNDO
O mundo político e social do Ocidente encontra-se exausto.
Desde as pregações de Pedro, o Eremita, até a morte do Rei Luís IX, diante de Túnis, acontecimento que colocara um dos derradeiros marcos nas guerras das Cruzadas, as sombras da idade medieval confundiram as lições do Evangelho, ensangüentando todas as bandeiras do mundo cristão.
Foi após essa época, no último quartel do século XIV, que o Senhor desejou realizar uma de suas visitas periódicas à Terra, a fim de observar os progressos de sua doutrina e de seus exemplos no coração dos homens.
Anjos e Tronos lhe formavam a corte maravilhosa. Dos céus à Terra, foi colocando outro símbolo da escada infinita de Jacob, formado de flores e de estrelas cariciosas, pod onde o Cordeiro de Deus transpôs as imensas distâncias, clarificando os caminhos cheios de trevas. Mas, se Jesus vinha do coração luminoso das esferas superiores, trazendo nos olhos misericordiosos a visão dos seus impérios resplandecentes e na alma profunda o ritmo harmonioso dos astros, o planeta terreno lhe apresentava ainda aquelas mesmas veredas escuras, cheias da lama da impenitência e do orgulho das criaturas humanas, e repletas dos espinhos da ingratidão e do egoísmo. Embalde seus olhos compassivos procuraram o ninho doce do seu Evangelho; em vão procurou o Senhor os remanescentes da obra de um de seus últimos enviados à face do orbe terrestre. No coração da Umbria haviam cessado os cânticos de amor e de fraternidade cristã. De Francisco de Assis só haviam ficado as tradições de carinho e de bondade; os pecados do mundo, como novos lobos de Gúbio, haviam descido outra vez das selvas misteriosas das iniqüidades humanas, roubando às criaturas a paz e aniquilando-lhes a vida.
- Helil - disse a voz suave e meiga do Mestres a um dos seus mensageiros, encarregado dos problemas sociológicos da Terra - meu coração se enche de profunda amargura, vendo a incompreensão dos homens, no que se refere às lições do meu Evangelho. Por toda parte é a luta fratricida, como polvo de infinitos tentáculos, a destruir todas as esperanças; recomendei-lhes que se amassem como irmãos, e vejo-os em movimentos impetuosos, aniquilando-se uns aos outros como Cains desvairados.
- Todavia - replicou o emissário solícito, como se desejasse desfazer a impressão dolorosa e amarga do Mestre - esses movimentos, Senhor, intensificaram as relações dos povos da Terra, aproximando o Oriente e o Ocidente, para aprenderem a lição da solidariedade nessas experiências penosas; novas utilidades da vida foram descobertas; o comércio progrediu além de todas as fronteiras, reunindo as pátrias do orbe. Sobretudo, devemos considerar que os príncipes cristãos, empreendendo as iniciativas daquela natureza, guardavam a nobre intenção de velar pela paisagem deliciosa dos Lugares Santos.
- Mas - retornou tristemente a voz compassiva do Cordeiro - qual o lugar da Terra que não é santo? Em todas as partes do mundo, por mais recônditas que sejam, paira a bênção de Deus, convertida na luz e no pão de todas as criaturas. Era preferível que Saladino guardasse, para sempre, todos os poderes temporais na Palestina, a que caísse um só dos fios de cabelo de um soldado, numa guerra incompreensível por minha causa, que, em todos os tempos, deve ser a do amor e da fraternidade universal.
E, como se a sua vista devassasse todos os mistérios do porvir, continuou:
- Infelizmente, não vejo senão o caminho do sofrimento para modificar tão desoladora situação. Aos feudos de agora, seguir-se-ão as coroas poderosas e, depois dessa concentração de autoridade e de poder, serão os embates da ambição e a carnificina da inveja e da felonia, pelo predomínio do mais forte.
A amargura divina empolgara toda a formosa assembléia de querubins e arcanjos. Foi quando Helil, para renovar a impressão ambiente, dirigiu-se a Jesus com brandura e humildade:
- Senhor, se esses povos infelizes, que procuram na grandeza material uma felicidade impossível, marcham irremediavelmente para os grandes infortúnios coletivos, visitemos os continentes ignorados, onde espíritos jovens e simples aguardam a semente de uma vida nova. Nessas terras, para além dos grandes oceanos, poderíeis instalar o pensamento cristão, dentro das doutrinas do amor e da liberdade.
E a caravana fulgurante, deixando um rastro de luz na imensidade dos espaços, encaminhou-se ao continente que seria, mais tarde, o mundo americano.
O Senhor abençoou aquelas matas virgens e misteriosas. Enquanto as aves lhe homenageavam a inefável presença com seus cantares harmoniosos, as flores se inclinavam nas árvores ciclópicas, aromatizando-lhe as eterizadas sendas. O perfume do mar casava-se ao oxigênio agreste da selva bravia, impregnando todas as coisas de um elemento de força desconhecida. No solo, eram os silvícolas humildes e simples, agurdando uma era nova, com o seu largo potencial de energia e bondade.
Cheio de esperanças, emociona-se o coração do Mestre, contemplando a beleza do sublimado espetáculo.
- Helil - pergunta ele - onde fica, nestas terras novas, o recanto planetário do qual se enxerga, no infinito, o símbolo da redenção humana?
- Esse lugar de doces encantos, Mestre, de onde se vêem, no mundo, as homenagens dos céus aos vossos martírios na Terra, fica mais para o sul.
E, quando no seio da paisagem repleta de aromas e de melodias, contemplavam as almas santificadas dos orbes felizes, na presença do Cordeiro, as maravilhas daquela terra nova, que seria mais tarde o Brasil, desenhou-se no firmamento, formado de estrelas rutilantes, no jardim das constelações de Deus, o mais imponente de todos os símbolos.
Mãos erguidas para o Alto, como se invocasse a bênção de seu Pai para todos os elementos daquele solo extraordinário e opulento, exclama então Jesus:
- Para esta terra maravilhosa e bendita será transplantada a árvore do meu Evangelho de piedade e de amor. No seu solo dadivoso e fertilíssimo, todos os povos da Terra aprenderão a lei da fraternidade universal. Sob estes céus serão entoados os hosanas mais ternos à misericórdia do Pai Celestial. Tu, Helil, te corporificarás na Terra, no seio do povo mais pobre e mais trabalhador do Ocidente; instituirás um roteiro de coragem, para que sejam transpostas as imensidades desses oceanos perigosos e solitários, que separam o velho do novo mundo. Instalaremos aqui uma tenda de trabalho para a nação mais humilde da Europa, glorificando os seus esforços na oficina de Deus. Aproveitaremos o elemento simples de bondade, o coração fraternal dos habitantes destas terras novas, e, mais tarde, ordenarei a reencarnação de muitos Espíritos já purificados no sentimento da humildade e da mansidão, entre as raças oprimidas e sofredoras das regiões africanas, para formarmos o pedestal de solidariedade do povo fraterno que aqui florescerá, no futuro, a fim de exaltar o meu Evangelho, nos séculos gloriosos do porvir. Aqui, Helil, sob a luz misericordiosa das estrelas da cruz, ficará localizado o coração do mundo!
Consoante a vontade piedosa do Senhor, todas as suas ordens foram cumpridas integralmente.
Daí a alguns anos, o seu mensageiro se estabelecia na Terra, em 1394, como filho de D. João I e de D. Filipa de Lencastre, e foi o heróico Infante de Sagres, que operou a renovação das energias portuguesas, expandindo as suas possibilidades realizadoras par além dos mares. O elemento indígena foi chamado a colaborar na edificação da pátria nova; almas bem-aventuradas pelas suas renúncias se corporificaram nas costas da África flagelada e oprimida e, juntas a outros Espíritos em prova, formaram a falange abnegada que veio escrever na Terra de Santa Cruz, com os seus sacrifícios e com os seus sofrimentos, um dos mais belos poemas da raça negra em favor da humanidade.
Foi por isso que o Brasil, onde confraternizam hoje todos os povos da Terra e onde será modelada a obra imortal do Evangelho do Cristo, muito antes do Tratado de Tordesilhas, que fincou as balizas das possessões espanholas, trazia já, em seus contornos, a forma geográfica do coração do mundo.
PÁTRIA DO EVANGELHO
Com a República, atingiu o Brasil a sua maioridade coletiva e as falanges do Infinito, naturalmente, concentraram as suas possibilidades e esforços no desenvolvimento da obra de Ismael no país do Cruzeiro.
Seus maiores eventos puramente políticos não deixaram, no entanto, de ser acompanhados pelos mensageiros do Bem, objetivando a tranqüilidade comum e a evolução geral.
Todavia, com o grande feito de 15 de Novembro de 1889, terminamos este esforço, á guisa de história.
Outros, por certo, consultando as razões dos fatos relacionados no tempo, poderão apresentar trabalho mais pormenorizado e melhor, no domínio dos estudos transcendentes do psicólogo e do historiador, onde se emaranham as causas profundas dos menores acontecimentos, englobando as atividades de quantos, ainda encarnados, se encontram em evidência no país e são suscetíveis de apresentar, de futuro, mais amplos esclarecimentos.
Nosso objetivo, trazendo alguns apontamentos à história espiritual do Brasil, foi tão-somente encarecer a excelência da sua missão no planeta, demonstrando, simultaneamente, que cada nação, como cada indivíduo, tem sua tarefa a desempenhar no concerto dos povos. Todas elas têm seus ascendentes no mundo invisível, de onde recebem a selva espiritual necessária à sua formação e conservação. E um dos fins principais do nosso esforço foi examinar, aos olhos de todos, a necessidade da educação pessoal e coletiva, no desdobramento de todos os trabalhos do país. Porque, a realidade é que o Brasil, na sua situação especialíssima e com o seu patrimônio imenso de riquezas, não poderá insular-se do resto do mundo ou acastelar-se na sua posição de Pátria do Evangelho, embora a época seja de autarquias detestáveis, neste período de decadência e transição de todos os sistemas sociais.
O maior problema é o da educação nacional, para que os filhos das outras terras, necessários e indispensáveis ao progresso econômico da nação, não se sintam dispostos a reviver, no Brasil, as taras de suas antigas organizações e sim, absorvidos no círculo espiritual do país do Evangelho, possam integrar as suas fileiras de fraternidade e evolução.
Apesar da recente filosofia do "bastar-se a si mesmo", nenhum país do mundo pode viver independente da comunidade internacional. Toda a grandeza material de um povo repousa na regularidade dos fenômenos de troca e todas as guerras, quase sempre, têm origem na desarmonia do comércio entre as nações. No Brasil, a chamada contribuição estrangeira é indispensável; e o único recurso, contra a incursão do elemento nocivo ou ameaçador da estabilidade das instituições brasileiras, é a educação ampla do povo, em cujos labores sagrados deveriam viver todos os programas do bom nacionalismo.
Se muitas escolas existem no Sul, onde somente se ensina o idioma alemão, em muitos casos é porque os professores do Brasil não se decidiram a enfrentar as surpresas da região, a fim de zelarem pelo patrimônio intelectual dos novos operários da pátria. Se algumas dezenas de agrônomos vieram diretamente de Tóquio para os riquíssimos vales do Amazonas, é que os agrônomos brasileiros não se animaram a trabalhar no sertão hostil, receosos do sacrifício. Entretanto, não faltaram espíritos abnegados e corajosos, no seio do povo fraterno que floresce no coração geográfico do mundo, ansiosos por participarem da grande obra construtiva de organização cultural e econômica da terra em que se desenvolvem numa grande tarefa de amor, se os ambientes universitários, com as suas habilitações oficiais, não estivessem abertos somente à aristocracia do ouro. A palavra de um mestre custa uma fortuna, apenas suscetível de ser remunerada pelas famílias mais abastadas e mais favorecidas, e nem sempre nesses ambientes confortáveis se encontram as almas apaixonadas pela luta em prol do progresso comum.
Nesta época de confusão e amargura, quando, com as mais justas razões, se tem, por toda parte, a triste organização do homem econômico da filosofia marxista, que vem destruir todo o patrimônio de tradições dos que lutaram e sofreram no pretérito da humanidade, as medidas de repressão e de segurança devem ser tomadas a bem das coletividades e das instituições, a fim de que uma onda inconsciente de destruição e morticínio não elimine o altar de esperanças da pátria. Que o capitalismo, visando à própria tranqüilidade coletiva, seja chamado pelas administrações ao debate, a incentivar com os seus largos recursos a campanha do livro, do saneamento e do trabalho, em favor da concórdia universal.
Não nos deteremos a falar, depois da República, de quantos se encontram ainda no cenáculo das atividades e dos feitos do país, porquanto semelhante ação de nossa parte constituiria uma intervenção indébita nas iniciativas e empreendimentos dos "vivos".
Jesus, que é a suprema personificação de toda a misericórdia e de toda a justiça, auxiliará a cada qual, no desdobramento dos seus esforços para a glória da nacionalidade.
O Brasil está cheio de ideologias novas, refletindo a paisagem do século; cabe aos bons operários do Evangelho concentrar suas atividades no esclarecimento das almas e na educação dos espíritos.
Todas as fórmulas humanas, dentro das concepções que exprimam, por mais alevantadas que se afigurem, são perecíveis e transitórias. A política sofrerá, no curso dos séculos, as alternativas do direito da força e da força do direito, até que o planeta possa atingir relativa perfeição social, coma cultura generalizada. A Ciência, como a Filosofia e as escolas sectárias, viverá entre dúvidas e vacilações, assentando seus feitos na areia instável das convenções humanas. Só o legítimo ideal cristão, reconhecendo que o reino de Deus ainda não e deste mundo, poderá, com a sua esperança e o seu exemplo, espiritualizar o ser humano, espalhando com os seus labores e sacrifícios as sementes produtivas na construção da sociedade do futuro.
Conhecedores dessa grande verdade, supliquemos a Jesus se digne derramar do orvalho de seu amor sobre os vermes da Terra.
Que as falanges de Ismael possam, aliadas a quantos se desvelam pela sua obra divina, reunir o material disperso e que a Pátria do Evangelho mais ascenda e avulte no concerto dos povos, irradiando a paz e a fraternidade que alicerçam, indestrutivelmente, todas as tradições e todas as glórias do Brasil.
1) Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho
E os verdadeiros aprendizes, os crentes sinceros no poder e na misericórdia do Senhor, esperam, com os seus labores obscuros, o advento da cristianização da humanidade, quando os homens, livres de todos os símbolos sectários de separatividade, podem entender, integralmente, as maravilhas ocultas da obra cristã. Nas suas dolorosas provações dos tempos modernos, quando quase todos os valores morais sofrem o insulto da mais ampla subversão, esses espíritos heróicos e humildes sabem, na sua esperança e na sua crença, que, se Deus permite a prática de tantos absurdos, por parte dos poderosos da Terra, que se embriagam com o vinho da autoridade e da ambição, é que todas essas lutas nada mais representam do que experiências penosas, por abreviar a compreensão geral das leis divinas no porvir. E, serenos na sua resignação e na sua sinceridade, conhecem, ainda, que as lições do Evangelho não são símbolos mortos e aguardam, cheios de confiança no mundo espiritual, a alvorada luminosa do renascimento humano.
Nessa abençoada tarefa de espiritualização, o Brasil caminha na vanguarda. O material a empregar nesse serviço não vem das fontes de produção originariamente terrena e sim do plano invisível, onde se elaboram todos os ascendentes construtores da Pátria do Evangelho.
Estas páginas modestas constituem, pois, uma contribuição humilde à elucidação da história da civilização brasileira em sua marcha através dos tempos. Têm por único objetivo provar a excelência da missão evangélica do Brasil no concerto dos povos e que, acima de tudo, todas as suas realizações e todos os seus feitos, forros de miseráveis troféus das glórias sanguinolentas, tiveram suas origens profundas no plano espiritual, de onde Jesus, pelas mãos carinhosas de Ismael, acompanha desveladamente a evolução da pátria extraordinária, em cujos céus fulguram as estrelas da cruz. São elas, ainda, um grito de fé e de esperança aos que estacionam no meio do caminho. Ditadas pela voz de quem já atravessou as estradas poeirentas e tristes da Morte, dirigem-se aos meus companheiros e irmãos da mesma comunidade e da mesma família, exclamando:
- Brasileiros, ensarilhemos, para sempre, as armas homicidas das revoluções! ... Consideremos o valor espiritual do nosso grande destino! Engrandeçamos a pátria no cumprimento do dever pela ordem, e traduzamos a nossa dedicação mediante o trabalho honesto pela sua grandeza! Consideremos, acima de tudo, que todas as suas realizações hão de merecer a luminosa sanção de Jesus, antes de se fixarem nos bastidores do poder transitório e precário dos homens! Nos dias de provação, como nas horas de venturas, estejamos irmanados numa doce aliança de fraternidade e paz indestrutível, dentro da qual deveremos esperar as claridades do futuro. Não nos compete estacionar, em nenhuma circunstância, e sim marchar, sempre, com a educação e coma fé realizadora, ao encontro do Brasil, na sua admirável espiritualidade e na sua grandeza imperecível!
Humberto Campos. (*)
* Espírito.1
O CORAÇÃO DO MUNDO
O mundo político e social do Ocidente encontra-se exausto.
Desde as pregações de Pedro, o Eremita, até a morte do Rei Luís IX, diante de Túnis, acontecimento que colocara um dos derradeiros marcos nas guerras das Cruzadas, as sombras da idade medieval confundiram as lições do Evangelho, ensangüentando todas as bandeiras do mundo cristão.
Foi após essa época, no último quartel do século XIV, que o Senhor desejou realizar uma de suas visitas periódicas à Terra, a fim de observar os progressos de sua doutrina e de seus exemplos no coração dos homens.
Anjos e Tronos lhe formavam a corte maravilhosa. Dos céus à Terra, foi colocando outro símbolo da escada infinita de Jacob, formado de flores e de estrelas cariciosas, pod onde o Cordeiro de Deus transpôs as imensas distâncias, clarificando os caminhos cheios de trevas. Mas, se Jesus vinha do coração luminoso das esferas superiores, trazendo nos olhos misericordiosos a visão dos seus impérios resplandecentes e na alma profunda o ritmo harmonioso dos astros, o planeta terreno lhe apresentava ainda aquelas mesmas veredas escuras, cheias da lama da impenitência e do orgulho das criaturas humanas, e repletas dos espinhos da ingratidão e do egoísmo. Embalde seus olhos compassivos procuraram o ninho doce do seu Evangelho; em vão procurou o Senhor os remanescentes da obra de um de seus últimos enviados à face do orbe terrestre. No coração da Umbria haviam cessado os cânticos de amor e de fraternidade cristã. De Francisco de Assis só haviam ficado as tradições de carinho e de bondade; os pecados do mundo, como novos lobos de Gúbio, haviam descido outra vez das selvas misteriosas das iniqüidades humanas, roubando às criaturas a paz e aniquilando-lhes a vida.
- Helil - disse a voz suave e meiga do Mestres a um dos seus mensageiros, encarregado dos problemas sociológicos da Terra - meu coração se enche de profunda amargura, vendo a incompreensão dos homens, no que se refere às lições do meu Evangelho. Por toda parte é a luta fratricida, como polvo de infinitos tentáculos, a destruir todas as esperanças; recomendei-lhes que se amassem como irmãos, e vejo-os em movimentos impetuosos, aniquilando-se uns aos outros como Cains desvairados.
- Todavia - replicou o emissário solícito, como se desejasse desfazer a impressão dolorosa e amarga do Mestre - esses movimentos, Senhor, intensificaram as relações dos povos da Terra, aproximando o Oriente e o Ocidente, para aprenderem a lição da solidariedade nessas experiências penosas; novas utilidades da vida foram descobertas; o comércio progrediu além de todas as fronteiras, reunindo as pátrias do orbe. Sobretudo, devemos considerar que os príncipes cristãos, empreendendo as iniciativas daquela natureza, guardavam a nobre intenção de velar pela paisagem deliciosa dos Lugares Santos.
- Mas - retornou tristemente a voz compassiva do Cordeiro - qual o lugar da Terra que não é santo? Em todas as partes do mundo, por mais recônditas que sejam, paira a bênção de Deus, convertida na luz e no pão de todas as criaturas. Era preferível que Saladino guardasse, para sempre, todos os poderes temporais na Palestina, a que caísse um só dos fios de cabelo de um soldado, numa guerra incompreensível por minha causa, que, em todos os tempos, deve ser a do amor e da fraternidade universal.
E, como se a sua vista devassasse todos os mistérios do porvir, continuou:
- Infelizmente, não vejo senão o caminho do sofrimento para modificar tão desoladora situação. Aos feudos de agora, seguir-se-ão as coroas poderosas e, depois dessa concentração de autoridade e de poder, serão os embates da ambição e a carnificina da inveja e da felonia, pelo predomínio do mais forte.
A amargura divina empolgara toda a formosa assembléia de querubins e arcanjos. Foi quando Helil, para renovar a impressão ambiente, dirigiu-se a Jesus com brandura e humildade:
- Senhor, se esses povos infelizes, que procuram na grandeza material uma felicidade impossível, marcham irremediavelmente para os grandes infortúnios coletivos, visitemos os continentes ignorados, onde espíritos jovens e simples aguardam a semente de uma vida nova. Nessas terras, para além dos grandes oceanos, poderíeis instalar o pensamento cristão, dentro das doutrinas do amor e da liberdade.
E a caravana fulgurante, deixando um rastro de luz na imensidade dos espaços, encaminhou-se ao continente que seria, mais tarde, o mundo americano.
O Senhor abençoou aquelas matas virgens e misteriosas. Enquanto as aves lhe homenageavam a inefável presença com seus cantares harmoniosos, as flores se inclinavam nas árvores ciclópicas, aromatizando-lhe as eterizadas sendas. O perfume do mar casava-se ao oxigênio agreste da selva bravia, impregnando todas as coisas de um elemento de força desconhecida. No solo, eram os silvícolas humildes e simples, agurdando uma era nova, com o seu largo potencial de energia e bondade.
Cheio de esperanças, emociona-se o coração do Mestre, contemplando a beleza do sublimado espetáculo.
- Helil - pergunta ele - onde fica, nestas terras novas, o recanto planetário do qual se enxerga, no infinito, o símbolo da redenção humana?
- Esse lugar de doces encantos, Mestre, de onde se vêem, no mundo, as homenagens dos céus aos vossos martírios na Terra, fica mais para o sul.
E, quando no seio da paisagem repleta de aromas e de melodias, contemplavam as almas santificadas dos orbes felizes, na presença do Cordeiro, as maravilhas daquela terra nova, que seria mais tarde o Brasil, desenhou-se no firmamento, formado de estrelas rutilantes, no jardim das constelações de Deus, o mais imponente de todos os símbolos.
Mãos erguidas para o Alto, como se invocasse a bênção de seu Pai para todos os elementos daquele solo extraordinário e opulento, exclama então Jesus:
- Para esta terra maravilhosa e bendita será transplantada a árvore do meu Evangelho de piedade e de amor. No seu solo dadivoso e fertilíssimo, todos os povos da Terra aprenderão a lei da fraternidade universal. Sob estes céus serão entoados os hosanas mais ternos à misericórdia do Pai Celestial. Tu, Helil, te corporificarás na Terra, no seio do povo mais pobre e mais trabalhador do Ocidente; instituirás um roteiro de coragem, para que sejam transpostas as imensidades desses oceanos perigosos e solitários, que separam o velho do novo mundo. Instalaremos aqui uma tenda de trabalho para a nação mais humilde da Europa, glorificando os seus esforços na oficina de Deus. Aproveitaremos o elemento simples de bondade, o coração fraternal dos habitantes destas terras novas, e, mais tarde, ordenarei a reencarnação de muitos Espíritos já purificados no sentimento da humildade e da mansidão, entre as raças oprimidas e sofredoras das regiões africanas, para formarmos o pedestal de solidariedade do povo fraterno que aqui florescerá, no futuro, a fim de exaltar o meu Evangelho, nos séculos gloriosos do porvir. Aqui, Helil, sob a luz misericordiosa das estrelas da cruz, ficará localizado o coração do mundo!
Consoante a vontade piedosa do Senhor, todas as suas ordens foram cumpridas integralmente.
Daí a alguns anos, o seu mensageiro se estabelecia na Terra, em 1394, como filho de D. João I e de D. Filipa de Lencastre, e foi o heróico Infante de Sagres, que operou a renovação das energias portuguesas, expandindo as suas possibilidades realizadoras par além dos mares. O elemento indígena foi chamado a colaborar na edificação da pátria nova; almas bem-aventuradas pelas suas renúncias se corporificaram nas costas da África flagelada e oprimida e, juntas a outros Espíritos em prova, formaram a falange abnegada que veio escrever na Terra de Santa Cruz, com os seus sacrifícios e com os seus sofrimentos, um dos mais belos poemas da raça negra em favor da humanidade.
Foi por isso que o Brasil, onde confraternizam hoje todos os povos da Terra e onde será modelada a obra imortal do Evangelho do Cristo, muito antes do Tratado de Tordesilhas, que fincou as balizas das possessões espanholas, trazia já, em seus contornos, a forma geográfica do coração do mundo.
PÁTRIA DO EVANGELHO
Com a República, atingiu o Brasil a sua maioridade coletiva e as falanges do Infinito, naturalmente, concentraram as suas possibilidades e esforços no desenvolvimento da obra de Ismael no país do Cruzeiro.
Seus maiores eventos puramente políticos não deixaram, no entanto, de ser acompanhados pelos mensageiros do Bem, objetivando a tranqüilidade comum e a evolução geral.
Todavia, com o grande feito de 15 de Novembro de 1889, terminamos este esforço, á guisa de história.
Outros, por certo, consultando as razões dos fatos relacionados no tempo, poderão apresentar trabalho mais pormenorizado e melhor, no domínio dos estudos transcendentes do psicólogo e do historiador, onde se emaranham as causas profundas dos menores acontecimentos, englobando as atividades de quantos, ainda encarnados, se encontram em evidência no país e são suscetíveis de apresentar, de futuro, mais amplos esclarecimentos.
Nosso objetivo, trazendo alguns apontamentos à história espiritual do Brasil, foi tão-somente encarecer a excelência da sua missão no planeta, demonstrando, simultaneamente, que cada nação, como cada indivíduo, tem sua tarefa a desempenhar no concerto dos povos. Todas elas têm seus ascendentes no mundo invisível, de onde recebem a selva espiritual necessária à sua formação e conservação. E um dos fins principais do nosso esforço foi examinar, aos olhos de todos, a necessidade da educação pessoal e coletiva, no desdobramento de todos os trabalhos do país. Porque, a realidade é que o Brasil, na sua situação especialíssima e com o seu patrimônio imenso de riquezas, não poderá insular-se do resto do mundo ou acastelar-se na sua posição de Pátria do Evangelho, embora a época seja de autarquias detestáveis, neste período de decadência e transição de todos os sistemas sociais.
O maior problema é o da educação nacional, para que os filhos das outras terras, necessários e indispensáveis ao progresso econômico da nação, não se sintam dispostos a reviver, no Brasil, as taras de suas antigas organizações e sim, absorvidos no círculo espiritual do país do Evangelho, possam integrar as suas fileiras de fraternidade e evolução.
Apesar da recente filosofia do "bastar-se a si mesmo", nenhum país do mundo pode viver independente da comunidade internacional. Toda a grandeza material de um povo repousa na regularidade dos fenômenos de troca e todas as guerras, quase sempre, têm origem na desarmonia do comércio entre as nações. No Brasil, a chamada contribuição estrangeira é indispensável; e o único recurso, contra a incursão do elemento nocivo ou ameaçador da estabilidade das instituições brasileiras, é a educação ampla do povo, em cujos labores sagrados deveriam viver todos os programas do bom nacionalismo.
Se muitas escolas existem no Sul, onde somente se ensina o idioma alemão, em muitos casos é porque os professores do Brasil não se decidiram a enfrentar as surpresas da região, a fim de zelarem pelo patrimônio intelectual dos novos operários da pátria. Se algumas dezenas de agrônomos vieram diretamente de Tóquio para os riquíssimos vales do Amazonas, é que os agrônomos brasileiros não se animaram a trabalhar no sertão hostil, receosos do sacrifício. Entretanto, não faltaram espíritos abnegados e corajosos, no seio do povo fraterno que floresce no coração geográfico do mundo, ansiosos por participarem da grande obra construtiva de organização cultural e econômica da terra em que se desenvolvem numa grande tarefa de amor, se os ambientes universitários, com as suas habilitações oficiais, não estivessem abertos somente à aristocracia do ouro. A palavra de um mestre custa uma fortuna, apenas suscetível de ser remunerada pelas famílias mais abastadas e mais favorecidas, e nem sempre nesses ambientes confortáveis se encontram as almas apaixonadas pela luta em prol do progresso comum.
Nesta época de confusão e amargura, quando, com as mais justas razões, se tem, por toda parte, a triste organização do homem econômico da filosofia marxista, que vem destruir todo o patrimônio de tradições dos que lutaram e sofreram no pretérito da humanidade, as medidas de repressão e de segurança devem ser tomadas a bem das coletividades e das instituições, a fim de que uma onda inconsciente de destruição e morticínio não elimine o altar de esperanças da pátria. Que o capitalismo, visando à própria tranqüilidade coletiva, seja chamado pelas administrações ao debate, a incentivar com os seus largos recursos a campanha do livro, do saneamento e do trabalho, em favor da concórdia universal.
Não nos deteremos a falar, depois da República, de quantos se encontram ainda no cenáculo das atividades e dos feitos do país, porquanto semelhante ação de nossa parte constituiria uma intervenção indébita nas iniciativas e empreendimentos dos "vivos".
Jesus, que é a suprema personificação de toda a misericórdia e de toda a justiça, auxiliará a cada qual, no desdobramento dos seus esforços para a glória da nacionalidade.
O Brasil está cheio de ideologias novas, refletindo a paisagem do século; cabe aos bons operários do Evangelho concentrar suas atividades no esclarecimento das almas e na educação dos espíritos.
Todas as fórmulas humanas, dentro das concepções que exprimam, por mais alevantadas que se afigurem, são perecíveis e transitórias. A política sofrerá, no curso dos séculos, as alternativas do direito da força e da força do direito, até que o planeta possa atingir relativa perfeição social, coma cultura generalizada. A Ciência, como a Filosofia e as escolas sectárias, viverá entre dúvidas e vacilações, assentando seus feitos na areia instável das convenções humanas. Só o legítimo ideal cristão, reconhecendo que o reino de Deus ainda não e deste mundo, poderá, com a sua esperança e o seu exemplo, espiritualizar o ser humano, espalhando com os seus labores e sacrifícios as sementes produtivas na construção da sociedade do futuro.
Conhecedores dessa grande verdade, supliquemos a Jesus se digne derramar do orvalho de seu amor sobre os vermes da Terra.
Que as falanges de Ismael possam, aliadas a quantos se desvelam pela sua obra divina, reunir o material disperso e que a Pátria do Evangelho mais ascenda e avulte no concerto dos povos, irradiando a paz e a fraternidade que alicerçam, indestrutivelmente, todas as tradições e todas as glórias do Brasil.
1) Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho
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